Tuesday, December 27, 2005
Sunday, December 18, 2005
É preciso não esquecer nada
É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.
É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.
O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.
O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos,
a idéia de recompensa e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos conosco, pois o resto não nos pertence.
Friday, December 16, 2005
O sono
O sono que desce sobre mim,
O sono mental que desce fisicamente sobre mim,
O sono universal que desce individualmente sobre mim —
Esse sono
Parecerá aos outros o sono de dormir,
O sono da vontade de dormir,
O sono de ser sono.
(Alvaro de Campos)
Wednesday, December 07, 2005
O estado de árvore é preciso
Para entrar em estado de árvore é preciso
partir de um torpor animal de lagarto às
3 horas da tarde, no mês de agosto.
Em 2 anos a inércia e o mato vão crescer
em nossa boca.
Sofreremos alguma decomposição lírica até
o mato sair na voz.
Hoje eu desenho o cheiro das árvores.
(Manoel de Barros)
Tuesday, December 06, 2005
Monday, December 05, 2005
Wednesday, November 30, 2005
O que significa um pensamento existencial?
É noite. A noite é muito escura. Numa casa a uma grande distância
Brilha a luz duma janela.
Vejo-a, e sinto-me humano dos pés à cabeça.
É curioso que toda a vida do indivíduo que ali mora,
e que não sei quem é,
Atrai-me só por essa luz vista de longe.
Sem dúvida que a vida dele é real e ele tem cara,
gestos, família e profissão.
Mas agora só me importa a luz da janela dele.
Apesar de a luz estar ali por ele a ter acendido,
A luz é a realidade imediata para mim.
Eu nunca passo para além da realidade imediata.
Para além da realidade imediata não há nada.
Se eu, de onde estou, só vejo aquela luz,
Em relação à distância onde estou há só aquela luz.
O homem e a família dele são reais do lado de lá da janela.
Eu estou do lado de cá, a uma grande distância.
A luz apagou-se.
Que me importa que o homem continue a existir?
(Alberto Caeiro)
Friday, November 25, 2005
Thursday, November 24, 2005
Thursday, November 17, 2005
Sunday, November 13, 2005
Cada dia passa … passa
Será que os ventos do Sul vêm do Norte?
Será que o que eu ouço é esta musiquinha mesmo?
As vezes o passarinho verde vem me visitar.
Só que nem sempre eu entendo o que ele me diz.
Monday, November 07, 2005
Wednesday, November 02, 2005
Thursday, October 27, 2005
- Solta um vapor de alambique!
terebintina, legume, malunga, maria-branca,
tiguaciba, água de briga, cambraia, patrícia, girgolina,
elixir, piribita, supupara, vocação, sete virtudes
Monday, October 24, 2005
Saturday, October 22, 2005
Tuesday, October 18, 2005
Poema Épico
Tudo vai seguindo no girar dos ciclos
Toda a capacidade de amar, de reciclar, de trasformar está presente
A vida é um grande poema, um poema épico, uma tragédia
Construo os versos a cada dia
Cada instante uma palavra
Cada pensamento uma ação dentro da reflexão
Sinto-me poeta, pois tenho a alma dos sofredores
Respiro cada momento desfazendo os meus nózinhos e refazendo-os
Sentir-me poeta faz parte de uma grande egotrip
Uma viagem para tentar compreender a verdade
O que? Que papo é esse?
Cuidado para não ficar inteligente demais
Talvez os poetas tenham a nescecidade de se expor para purgar a dor
A dor de estar vivo
A dor que precede o prazer de amar
Monday, October 17, 2005
Caciques orgiásticos do tambor
Bate o tambor
no ritmo dos sonhos espantosos
no ritmo dos naufrágios
no ritmo dos adolescentes à porta dos hospícios
no ritmo do rebanho de atabaques
Bate o tambor
no ritmo das oferendas sepulcrais
no ritmo da levitação alquímica
no ritmo da paranóia de Júpiter
(Roberto Piva)
Sunday, October 16, 2005
Música... Que sei eu de mim?
MÚSICA... Que sei eu de mim?
Que sei eu de haver ser ou estar?
Música... sei só que sem fim
Quero saber só de sonhar...
Música... Bem no que faz mal
À alma entregar-se a nada...
Mas quero ser animal
Da insuficiência enganada
Música... Se eu pudesse ter,
Não o que penso ou desejo,
Mas o que não pude haver
E que até nem em sonhos vejo,
Se também eu pudesse fruir
Entre as algemas de aqui estar!
Não faz mal. Flui,
Para que eu deixe de pensar!
(Fernando Pessoa)
Saturday, October 15, 2005
Wednesday, October 12, 2005
Movo meu rosto no espelho
Comovo, não salvo, não mudo
Meu sujo olho vermelho
Não fico parado, não fico calado, não fico quieto
Corro, choro, converso
E tudo o mais jogo num verso
Intitulado mal secreto
Monday, October 10, 2005
Saturday, October 08, 2005
Thursday, October 06, 2005
Muito cuidado
Sanguessugas, vampiros, usurpadores, ladrões, mentirosos, vilões, enganadores, aproveitadores, a qualquer momento podemos nos deparar com toda sorte de escumalha.
Como já dizia Guimarães Rosa, viver é muito perigoso.
Wednesday, October 05, 2005
Tuesday, October 04, 2005
Momento de Poesia
Se me ponho a trabalhar
e escrevo ou desenho
logo me sinto tão atrasado
no que devo à eternidade,
que começo a empurrar para diante o tempo
e empurro-o, empurro-o à bruta
como empurra um atrasado,
até que cansado me julgo satisfeito;
e o efeito da fadiga
é muito igual à ilusão da satisfação!
Em troca, se vou passear por aí
sou tão inteligente a ver tudo o que não é comigo.
Compreendo tão bem o que não me diz respeito,
sinto-me tão chefe do que é fora de mim,
dou conselhos tão bíblicos aos aflitos
de uma aflição que não é minha,
dou-me tão perfeitamente conta do que
se passa fora das minhas muralhas
como sou cego ao ler-me ao espelho,
que, sinceramente não sei qual seja melhor,
se estar sozinho em casa a dar à manivela ao mundo,
se ir por aí a ser o rei invisível de tudo o que não é meu.
(Almada Negreiros)
Monday, October 03, 2005
Saturday, October 01, 2005
Friday, September 30, 2005
Tuesday, September 27, 2005
Viva o dia dos cantores!!!
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico.
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
(Viagem / Cecília Meireles)
Onde está o guarda-chuva?
Não há guarda-chuva
contra o poema
subindo de regiões onde tudo é surpresa
como uma flor mesmo num canteiro.
Não há guarda-chuva
contra o amor
que mastiga e cospe como qualquer boca,
que tritura como um desastre.
Não há guarda-chuva
contra o tédio:
o tédio das quatro paredes, das quatro
estações, dos quatro pontos cardeais.
Não há guarda-chuva
contra o mundo
cada dia devorado nos jornais
sob as espécies de papel e tinta.
Não há guarda-chuva
contra o tempo,
rio fluindo sob a casa, correnteza
carregando os dias, os cabelos.
(A Carlos Drummond de Andrade / João Cabral de Melo Neto)
Sunday, September 25, 2005
Mary
Um minuto de estrondo a idade reencontrada. As taças para o brinde, porque hoje sou de novo uma mulher com sutiã grená, polindo os dentes sem pressa e desenhando a boca em coração. Basta, nem só eu respondo pela fome do mundo, e vou certificar-me, se ainda me olham duas vezes, se ainda, intimido, se pelo que amo ainda faço a face dos homens abrandada e ansiosa. Enquanto dura a trégua, vou guerrear.
(Adélia Prado)
Saturday, September 24, 2005
Friday, September 23, 2005
Wednesday, September 21, 2005
Saudade
Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas as vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida
(Clarice Lispector)
Tuesday, September 20, 2005
O Bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
(Manuel Bandeira)
Monday, September 19, 2005
Friday, September 16, 2005
babynolia
Que que eu quero mais?
Se eu sei que a vida é bela e linda!
Que que eu quero mais?
Se eu sei que eu estou de bem com a vida!
Mag,
Mag, mag.
Magnólia
Thursday, September 15, 2005
No fim de tudo dormir
No fim de tudo dormir.
No fim de quê?
No fim do que tudo parece ser...,
Este pequeno universo provinciano entre os astros,
Esta aldeola do espaço,
E não só do espaço visível, mas até do espaço total.
(No fim, Álvaro de Campos)
Wednesday, September 14, 2005
Subscribe to:
Posts (Atom)